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Somos vistos tanto quanto vemos

Quando nos relacionamos por meio do utilitarismo, entramos em um jogo de poder e num modo competitivo, em que buscamos constantemente estar em primeiro lugar. Esse comportamento não apenas afeta nossas interações com os animais, mas também se reflete em relações interpessoais e institucionais, onde a hierarquia e a busca por validação muitas vezes sobrepõem a empatia e a cooperação. Nesse processo, acabamos acreditando que o nosso ponto de vista é o mais importante, o único e o central. É como se criássemos um "antropocentrismo do antropocentrismo", um micro-antropocentrismo, um auto-antropocentrismo.


Um exemplo disso, que percebo muito nas nossas relações com os animais, é quando visitamos zoológicos. Frequentemente, encaramos esses espaços como lugares que devem nos servir, como uma fonte de entretenimento. No entanto, poderíamos abordá-los como espaços de educação e conscientização, refletindo sobre a preservação das espécies, a importância da biodiversidade e a relação entre humanos e natureza. Isso nos permitiria uma experiência mais rica e significativa, tanto para nós quanto para os animais. Poderíamos parar e realmente observar os animais que estão ali, tentar entender, tentar conhecê-los. Observamos os animais por poucos segundos, tiramos uma foto e seguimos em frente, sem compreender a verdadeira função ou importância dos zoológicos. O que esquecemos é que estar ali é uma oportunidade de relacionamento. E todo relacionamento é uma via de mão dupla: da mesma forma que olhamos para o animal, ele também nos observa.


Isso ficou muito claro para mim com a chegada do mais novo membro da família multiespécie, o coelho Caetano. Ele chegou em um estado de abandono, após ter vivido toda sua vida como reprodutor. Desde o primeiro momento, meu maior cuidado foi me apresentar de forma não invasiva. Entretanto, por precisar cuidar de sua saúde e exercer a função de guardiã dele, precisei mantê-lo próximo ao meu local de trabalho.


Caetano me observava todos os dias, observava quando sentava no computador e passava horas de frente para a tela, me observava sair para ir ao banheiro, voltar com água, me observava deitar ao lado dele e não fazer nada, me observava enquanto o encarava, enquanto o manipulava para dar remédio ou quando o acariciava. Até que um dia, Caetano tomou a decisão de sair da toca, vir até mim, deitar ao meu lado e pedir carinho. Naquele instante, senti-me profundamente contemplada e compreendi o verdadeiro significado da nossa relação. Percebi que não se tratava de um resgate, mas de um encontro. Um encontro em que nos encontramos de verdade.


Uma relação não é apenas sobre o quanto você se vê nela, mas também sobre como o outro te enxerga. Nas relações entre humanos, por exemplo, em uma amizade, não se trata apenas de como nos sentimos valorizados, mas de perceber o quanto estamos dispostos a valorizar e compreender a perspectiva do outro. É sobre o quanto ambos estão dispostos a se verem e se aceitarem exatamente como são.

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Prazer, a humana.

Olá, meu nome é Marcela Figueiredo, sou artista, autista, psicóloga e arteterapeuta responsável por uma linda - e enorme - família multiespécie. Seja bem-vinde ao nosso mundo.
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