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O Silêncio no Aquário: A Dor e o Amor Invisíveis.

Recentemente, perdi três peixinhos bettas de forma abrupta: Cosmo, Lázaro e Nina. Acho que nunca compartilhei aqui minha experiência com a perda de peixes, talvez por medo do julgamento.O ser humano, dentro das dinâmicas de relacionamento em que vive, tem uma mania estranha: a de se comparar, até na dor. Parece haver uma necessidade de "competir" para ver quem sofre mais. Além disso, a dor do outro é frequentemente desmerecida quando não é compreendida.


A sociedade nos permite viver o luto apenas dentro do núcleo familiar: pai, mãe, filhos e irmãos. Quanto mais distante desse núcleo, mais rápido se espera que a dor seja superada. Na verdade, essa cobrança pela superação é uma cobrança pelo esquecimento, como se fosse possível esquecer quem amamos. Isso representa um mecanismo de defesa de quem não sabe lidar com a dor nem com a presença da morte. Porém, essa expectativa se torna uma violência, negando o direito de vivermos nossa dor, que só existe porque amamos.


Quando se trata de outras espécies, o luto se torna ainda mais incompreendido. Para muitos, sofrer por um animal é audacioso. Assim como no núcleo humano, há uma hierarquia de aceitação: primeiro, os cães. No entanto, o luto não pode se prolongar, afinal, “cachorro não é filho” — mesmo que ocupe um espaço de cuidado e amor tão importante quanto qualquer outro ser. Depois, os gatos, mas ainda assim, o sofrimento deve ser contido porque “gatos gostam da casa, não do humano”, certo? Conforme nos distanciamos dos mamíferos, torna-se ainda mais difícil para os outros compreenderem o luto: sofrer por um coelho, rato, hamster, iguana, cobra, aranha... ou por um peixe? “Peixe não interage!”


No entanto, é aí que as pessoas não entendem: as relações são construídas. Para se relacionar com um peixe, você precisa querer. Precisa demonstrar interesse. Precisa desafiar a lógica do “tempo produtivo”, sentar-se, observar o aquário, conversar com o animal mesmo à distância, perceber como ele vive, quem ele é, o que faz. E então, chega o momento em que ele também te reconhece.


O amor exige tempo para se desenvolver. E quando é retirado de forma abrupta, deixa marcas que sangram todos os dias: ao vermos o espaço vazio, o aquário desocupado, quando a rotina de alimentar o peixe deixa de existir, ou a sensação de ser observado por aqueles olhos atentos — até mesmo nadando em nossa direção. Peixes interagem; basta estar disposto a sentir. Assim como a vida.


Precisamos aprender a respeitar o luto em todas as suas formas, porque cada amor é único — seja por humanos ou por aqueles que, de alguma forma, nos ensinaram a olhar o mundo com outros olhos.

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Prazer, a humana.

Olá, meu nome é Marcela Figueiredo, sou artista, autista, psicóloga e arteterapeuta responsável por uma linda - e enorme - família multiespécie. Seja bem-vinde ao nosso mundo.
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