O cuidado entre o Porto e a Falta
- mardeafectos
- há 2 dias
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Mãe de pets realmente não existe. Afinal, eu não pari vocês. Afinal, vocês não são humanos. Afinal, o peso social exercido não é o mesmo.Afinal...
É isso o que algumas pessoas alegam quando conversamos sobre maternagem no mundo animal e entre espécies.Não sei se tenho uma opinião formada sobre esse assunto — e, sinceramente, não sei se quero ter.Na realidade, esse debate só me chama a atenção para como nossa cultura insiste em desmerecer o diferente, apenas para não encarar a raiz da questão.
Pra quê perder tempo desvalorizando o ato de cuidar do outro, se você pode olhar para o que precisa e exigir isso pra si?Cuidar se tornou um ato individualizado — e como isso nos machuca, pouco a pouco, por dentro.
Entre especismos, ausência de redes de cuidado e uma luta constante contra a individualização das responsabilidades coletivas, não sei se me vejo como mãe. Para o argumento de que "eles já têm mãe", bom... se fosse só uma questão de laços biológicos, por que existiria a adoção?
Vivemos em uma cultura que centraliza o cuidado — e, nesse cuidado, eu fico noites sem dormir preocupada com alguém doente, deixei de fazer cálculos sobre os gastos porque sei que não terei retorno financeiro, nem controle — apenas aceitei o caos e a necessidade de arcar com tudo, não gosto de viajar porque eles ficam péssimos sozinhos, deixo de ter alguns momentos de lazer por medo de faltar pra eles, já deixei de ir ao médico para pagar as necessidades deles.
Sofro pelo medo da falta: de ser falta pra eles, de precisar negar, de aceitar minha condição humana e imperfeita de que, sim, da mesma forma que ofereço preenchimento, também ofereço ausência.
E quando me dou conta, não é só sobre eles. É sobre mim. Sobre o que se espera de quem cuida — e como esse cuidado se esgota quando não é sustentado por uma rede.
Mas não falo apenas de sacrifícios. Falo da busca constante por proporcionar caminhos e ambientes que floresçam suas naturezas. Longe de mim querer que eles sejam algo que não são.
Acho que preencho os requisitos da maternagem — e tenho certeza de que eles me veem como um porto seguro. E eu os vejo como parte integrante de mim.
Se eles pudessem falar, talvez me chamassem de Lar. Ou Humana — o equivalente a Mãe no Português anti-animalcêntrico e antropocêntrico. Ou talvez, nem precisassem de nome — só da certeza de que estou aqui.
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