A humilhação orelhuda é indigna
Era final de domingo quando percebi que meu celular não estava carregando. Foi questões de segundos até estar segurando um cabo partido em dois em virtude dos dentes aguçados de uma coelha. Provavelmente, Efigênia.
Resignada, apenas assumi que iniciaria minha semana no centro da cidade atrás de cabos para recarregar o celular. Não há muito o que se fazer: não se luta contra a natureza.
No dia seguinte acordei, fiz os afazeres da família multiespécie e corri para a loja antes que ficasse completamente incomunicável. Porém, ao retornar para casa, me deparei com uma quantidade de pelo que só me fez pensar que Frederico havia entrado em casa e brigado com Antônio.
Mas não, a cena se demonstrou muito mais assustadora: era Madalena retirando os próprios tufos de pelo.
E coelhas fazem isso apenas quando estão para parir.
Na mesma hora, mandei mensagem para minha veterinária aos berros perguntando se havia alguma possibilidade da castração de Frederico ter dado errado pois, Madalena estava fazendo ninho.
Se eu puder lhe aconselhar, estimável leitor, tenha veterinários tão doidos quanto você.
Pois, de repente, não era o desespero de uma tutora maluca. Era o desespero de uma tutora desorientada e uma veterinária confusa.
“Calma, deve ser gravidez psicológica”, me orientou...
“mas... e se Efigênia for macho?”
Caos generalizado.
“Vê se Efigênia tem saco!!” Me escrevia ela sem parar.
Para variar, Efigênia, com seu espirito livre já havia passado entre minhas pernas e corrido para o jardim onde pulava de um lado para o outro como se não houvesse amanhã, completamente despreocupada com a possibilidade de ser pai.
Diferente de mim, que estava aterrorizada com a possibilidade de ser avó.
Minha casa era uma antiga escola em que tinha um teatro em cima da minha garagem e, pelo lado de fora, há uma escada de concreto que cria uma parede funda dentro da garagem. Foi ali que encurralei a futuro pai.
Ao pegá-la, levantei com tanta pressa que me esqueci de onde estava, batendo a cabeça contra o concreto. Nesse momento, vi pontos pretos, minha pressão baixou, quase desmaiei.
Mas, não soltei a coelha pois meus deveres de mãe de pet são mais importantes que um possível traumatismo craniano.
Após uma quantidade de arranhões que prefiro não comentar, lá estava ela, entre as pernas de Efigênia: uma linda pepeca.
Uma onda de alívio percorreu meu corpo até que a veterinária comentou: “pode ser que tenha ficado algum espermatozoide no canal do Frederico. Amanhã passo aí e dou uma olhada”.
Antes que o leitor me crucifique, as meninas são filhotes e estávamos esperando a idade correta para castrar: que completariam agora em agosto.
Decidida a seguir a vida e não surtar por uma gravidez santa de Maria Madalena, fui arrumar a garagem onde havia me acidentado. Lá, fica o filtro do lago que tanto amo e cuido. Ao colocar o cabo na tomada, houve uma explosão que, por sorte estava de galocha, senão, temo que além de um traumatismo craniano, também levaria um choque que me deixaria tirada no chão.
Sem entender nada, olhei para o cabo e vi que estava completamente roído.
Frederico.
Cansada da humilhação orelhuda. Optei por encerrar o dia.
Sentei no sofá para ver uma série e me regular. Me lembrei então que de meu celular havia já sofrido seu burnout e estava sem bateria. Coloquei para carregar enquanto assistia a minha série favorita.
Foi questão de olhar para o lado que vi: Efigênia em cima do banco com a boca no cabo. Não houve tempo de gritar, correr, nada... Apenas vi o cabo se partindo ao meio.
Resignada. Peguei o carregador extra que comprei e coloquei em outro cômodo.
Deitada no sofá após ter sofrido duas tentativas de homicídio por parte de coelhos, Madalena, sobe no sofá e me pede carinho. Logo em seguindo, surge Fifi.
E nesse momento, muito mais calma ao saber que minha bebê não estava grávida, eu só tive uma certeza:
De que queria outro coelho.
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